sexta-feira, 15 de outubro de 2010

O Arquivo Tatsumi Hijikata

Queridos, é com grande grandiosidade que venho publicar aqui no bloguezinho coxo, também parco militante de transcrições provindas da língua estrangeira, revolucionário causídico de fundo ressentido por nos encontrarmos nessa senzala cultural nacional, a tradução que fiz unicamente de pura, imaculada e boa vontade a fim de compartilhar convosco essa entrevista com os responsáveis nipônicos por tocar o já fundado e estabelecido Arquivo Tatsumi Hijikata. Ao longo das réplicas e tréplicas transcritas – que não possuem, já adianto, um profundo valor filosófico-acadêmico e servem senão de algum modesto deleite casual, no qual passamos a nos sentir íntimos deste gênio genioso que foi o sensei Hijikata – poderemos nos deparar com prazer suave e prolongado o conceito de “arquivo genético” e detalhes que dizem respeito ao longíquo cotidiano dos conviviais do mestre. Pois bem senhores, feitos os circunlóquios labirínticos e destilados os prolegómenos, vamos a ela...

Entrevista publicada em http://performingarts.jp/E/art_interview/1.html
Traduzido por Roger Valença

O Butoh nasceu no Japão como uma nova forma de expressão corporal que causou uma reviravolta nos conceitos convencionais da dança e é conhecido vastamente ao redor do mundo hoje em dia. Devido à longa presença de butoístas como Akira Kasai e Ko Murobushi como instrutores no Centro Nacional de Dança Contemporânea Angers e ao inúmeros workshops realizados, o Butoh tem tido uma presença maior do que muitos japoneses percebem como uma nova forma de expressão na dança. Foi Tatsumi Hijikata que deu à luz à arte do Butoh, e 2011 marca o viségimo quinto aniversário de sua morte. Mais de meio século se passou desde que Hijikata criou e performou o que é considerado o primeiro trabalho de Butoh em 1959, pegando sua influência e título do pequeno romance de Yukio Mishima, Kijinki (Amores Proibidos). Durante esse tempo, o Butoh não apenas tem continuado como uma forma de dança no Japão mas continua a exercer uma profunda influência em artistas ao redor do mundo, conhecido pelo nome original em Japonês.

Hoje, o "Arquivo Tatsumi Hijikata” do Centro de Pesquisa de Artes e Administração Artística da Universidade de Keio em Tóquio coletou um arquivo definitivo dos materiais de Hijikata e sua arte. O arquivo se instarou em 1998 com um centro de materiais da coleção do estúdio de Hijikata, o Asbestos Studio. Nesta entrevista, um dos iniciadores do movimento para criar este arquivo, o crítico de dança Tatsuro Ishii, conversa com Takashi Morishita, a pessoa responsável pelo arquivo, sobre seu conteúdo e sobre como é utilizado. (entrevistador: Tatsuro Ishii)


Editor: No dia primeiro de Junho desde ano (2010) o mundialmente-famoso dançarino de Butoh, Kazuo Ohno morreu aos 103 anos. Como parte de um modo de honrar sua memória, nós planejamos esta entrevista a respeito do reconhecido fundador do Butoh, Tatsumi Hijikata. Embora Hijikata tenha falecido em 1986, um Arquivo contendo uma coleção de filmagens de suas performaces, documentos e documentários como Butoh-fu foi estabelecido e agora serve como uma importante fonte de pesquisa para introduzir o Butoh, no Japão e além. Também na internet uma lista de conteúdos do arquivo e uma cronologia da carreira de Hijikata estão postados, e de interesse especial temos a página de “Portas Labyrintus” de Hijikata providenciando um índice dos vários pôsteres criados para suas performances e materiais adicionais que vai servir como uma fonte de informação de fácil apreciação até mesmo para os novatos no assunto. Antes de entrarmos em discussão a respeito do Arquivo, gostaríamos de pedir aos senhores Ishii e Morishita para contar a respeito de seu envolvimento individual com Hijikata e seu trabalho. Após isso, gostaríamos de perguntar aos senhores a respeito do status atual e das atividades do Arquivo.

Ishii: Mais do que muitas pessoas no Japão imaginam, o Butoh se estabeleceu mundialmente como uma nova forma de expressão na dança. Eu acredito que isto se deu certamente porque (o butoh) sucedeu em tocar adiante uma nova forma que era antitética à estética da dança ocidental como o balé clássico, que é baseado na beleza simétrica da forma humana. Resumidamente, sucedeu ao dar uma forte presença de palco e um poder expressivo à fisicalidade que normalmente tem associações negativas na sociedade, como doenças, velhice e deficiências.No centro desta nova arte estava o carismático Tatsumi Hijikata, de quem se diz ter fundado o movimento Butoh com seu trabalho "Kinjiki" em 1959. Afortunadamente, eu não era um conhecido pessoal de Hijikata durante sua vida, mas no ano seguinte após sua morte, em 1987, uma conferência acadêmica sobre o Butoh, focando em Tatsumi Hijikata foi concebida no campus Hiyoshi da universidade Keio onde eu lecionava. Dentre os participantes estavam o [crítico de cinema] Donald Ritchie, [o crítico e diretor teatral] TetsujiTakechi e a viúva de Tatsumi Hijikata, Akiko Motofuji. Os membros do comitê da conferencia incluíam [os críticos de dança] Miyabi Ichikawa e Kazuko Kunioshi. Durante a conferência, servi como intérprete de Donald Richie. Como a casa-estúdio de Hijikata, o Estúdio Asbestos, era próximoa de onde eu vivia, comecei a ter variadas discussões com a senhora Motofuji após aquela conferência.Eu pensava que, considerando o fato do Butoh ter nascido no Japão e estar tendo uma influência tão grande internacionalmente com as novas questões que colocava, especialmente dentro do contexto do desenvolvimento da dança contemporânea, me pareceu normal ser apropriado ao governo japonês, às prefeituras e governos municipais tomarem à frente criando instalações que dariam suporte a pesquisadores conterrâneos e internacionais e também a profissionais de Butoh. Mas, infelizmente, isto não estava acontecendo. Então, eu pensei que seria uma boa idéia se pudéssemos começar a ter uma aplicação neste sentido advindo de uma instituição particular comoa Universidade Keio, mesmo que fosse apenas numa pequena escala. Eu conversei com a senhora Motofuji a respeito disso e, ao mesmo tempo, eu levei a idéia ao Centro de Artes da universidade. Eu obtive uma resposta muito positiva de ambos os lados, o que levou à fundação do "Arquivo Tatsumi Hijikata" em 1998. Embora eu tenha estado envolvido desde então, o Sr. Morishita é atualmente o principal envolvido na condução do Arquivo.


Morishita: Eu era o responsável pela biblioteca do Estúdio Asbestos, então tive a oportunidadede cooperar no projeto do arquivo no Centro de Artes da Universidade Keio. Meu envolvimento com eles começou com a edição do livro "Shiki no tame no niju-nana ban" (Vinte e sete noites paraquatro estações) que foi publicado para comemorar a abertura do Arquivo. Na época eu os ajudava ocasionalmente. Não foi até 2003, contudo, que eu me tornei um membro oficial da equipe. Eu originalmente conheci Hijikata quando era estudante na universidade. Eu era estudante na "Universidade de Wasea" na época e estava interessado em cinema. Por alguma razão, eu tive a oportunidade de ir ao Estúdio Asbestos para emprestar um filme. Eu acredito que foi em 1972, e, após isso, eu visitei o Estúdio em diversas ocasiões. No estúdio daquela época, Hijikata vivia no lugar e aceitava qualquer jovem interessado em Butoh para estudar, a maioria deles vivendo junto num tipo de comunidade. Estudantes de arte iam até lá e logo decidiam a começar a fazer Butoh. Logo eu passei a freqüentar o lugar e comecei a ajudar tomando notas das coisas que Hijikata dizia enquanto ensinava. Então, um dia, Hijikata me disse “Nós temos uma grande performance se aproximando, você nos ajuda na produção?” Isso foi em outubro de 1972 e o trabalho era "Shiki no tame no niju-nana ban". Antes disso, eu nunca havia estado envolvido com artes performáticas. Então foi minha primeira experiência. Eu estive envolvido em tudo com Hijikata, começando pela procura de um teatro para utilizar.

I: "Shiki no tame no niju-nana ban" foi apresentado de 25 de outubro até 20 de novembro no "Teatro de Arte Shinjuku Bunka" como uma primeira-performance comemorativa para os formandos da "Cia Hangi Daitokan Daini-ji Ankoku Butoh-ha", e foi uma produção que marcou época. Consistia das apresentações consecutivas dos trabalhos "Hoso-tan" (História da Varíola), "Susame-dama", "Garasu-ko", "Nadare-Ame" e "Gibasan". Pode ser considerada umas das obras-primas neste meio século da história do Butoh. Isso significa que o Sr. Morishita teve a sorte de conhecer Hijikata no período mais importante do Estúdio Asbestos

M: Eu não fui ao Estúdio com a intenção de me tornar um dançarino de Butoh e eu não vivia junto com os outros dançarinos, então eu me encontrava numa posição ligeiramente diferente da deles. Claro, eu estava lá nos ensaios e era praticamente um coabitante quando estávamos trabalhando no "Shiki no tame no niju-nana ban". Aquela era a primeira produção em que experienciei o Butoh de Hijikata e, naturalmente, eu fiquei muito tocado com aquilo tudo. Trabalhar com ele me fez sentir que eu tinha que fazer tudo o que ele dizia (risos). Mas, embora eu o respeitasse muito, eu não era como os dançarinos e atores, que estavam sempre tensos na presença do mestre. Talvez porque eu trabalhasse sob a tutela da senhora Motofuji f azendo o trabalho de produção. Mas eu nomeei Hijikata como “sensei”, assim como seus aprendizes de dança fizeram.

I: O que você fez após a universidade?

M: Eu fui para a escola de graduação, então eu continuei a ajudar sempre que havia alguma performance. Mas em 1978, Hijikata fechou o Estúdio Asbestos e não houveram atividades por um bom tempo depois disso. Após as últimas apresentações em Paris ("Maten" para o Festival de Outono) aquele ano eu não tive a oportunidade de visitar o Estúdio. Eu estava trabalhando com edição na época e arranjei um emprego numa editora. Entretanto, cerca de dois ou três anos antes da morte de Hijikata ele voltou à ativa e me pediu para vir trabalhar com ele novamente. Em 1985, o ano anterior à sua morte, eu retornei ao Estúdio e comecei a ajudar com a produção de novo.

I: É sabido que Hijikata mantinha diversas pessoas ao seu redor para anotar suas falas. Você poderia nos contar sobre isso?

M: Na época, quando Hijikata recebia pedidos de artigos e dissertações de editoras e afins, ele não os escrevia, ele ditava. Tanto a Sra. Motofuji, eu ou algum de seus aprendizes escreviamos o que ele ditava e depois aplicávamos às normas gramaticais. Hijikata tinha o que queria dizer tão bem articulado em sua cabeça que podia ditar um artigo completo palavra a palavra de maneira que se poderia imprimir praticamente do modo como havia sido ditada. Ele podia fazer notas iniciais, mas parecia que quando ditava, ele já havia organizado o suficiente em sua mente que sobrava muito pouco a ser corrigido por nós. Entretanto, de tempos em tempos apareciam expressões pouco usuais ou palavras no que ele dizia que nos fazia recorrer ao dicionário para confirmar. Quando nós consultávamos, havia vezes em que a expressão em questão não estava nem no dicionário. Mas Hijikata dizia que não importava. O trabalho "Yameru Maihime" que acabou sendo publicado pela editora Hakusuisha em 1983 é baseado na versão original de uma séria de artigos publicados na revista Shingeki de 1977 a 78, e eu anotei os ditados de Hijikata para parte do texto original. É muito interessante comparar isto com o autor Osamu Dazai que trabalha da mesma forma (por ditados). Hijikata era uma pessoa extremamente interessante quando envolvido numa discussão, uma pessoa típica do nordeste do Japão, da região de Tohoku. Mas, infelizmente, muito poucas de suas discussões foram gravadas.

I: Yameru Maihime é considerada a bíblia do Butoh de Hijikata hoje em dia. Escrita num estilo literário único, explora as memórias de sua infância em Tohoku e contêm muitas expressões que fornecem descrições sucintas de imagens físicas do corpo. Com seu dialeto regional particular existem muitas passagens que são difíceis de entender para a maioria dos japoneses. Por exemplo, uma passagem diz “Pensando que seria boa a morte de alguém, eu engatinho sob o alpendre, e, com certeza, como se alguém houvesse morrido, há uma aranha tecendo a teia no escuro”. É realmente supreendente aprender que este tipo de passagem foi ditada e não escrita. Eu gostaria de continuar agora com nosso tema principal, o Arquivo Tatsumi Hijikata. Como eu fui uma das pessoas envolvidas com sua fundação, eu vou complementar com algumas informações adicionais. Os materiais que formaram o núcleo original do Arquivo foram os materiais do "Arquivo Memorial Tatsumi Hijikata", no qual a Sra. Motofuji usou de seu próprio acervo para compilar, logo após a morte de Hijikata, não foi?

M: Sim. Quando Hijikata faleceu em 1986 havia um plano de publicar uma coleção de todos os seus trabalhos, e ao mesmo tempo foi proposto um plano para organizar um arquivo. Foi montado um escritório para o arquivo e logo em seguida nós vimos o arquivo fundado. Muitas pessoas notáveis vieram para integrar o comitê de direção. A reunião do comitê acontecia uma ou duas vezes ao ano.

I: Quem eram algumas das pessoas envolvidas com o comitê de direção?


M: Incluíam Yoko Ashikawa, Koichi Iijima, Tatsuo Ikeda, Masuo Ikeda, Arata Isozaki, Makoto Ooka, Nagisa Ohshima, Juro Kara, Natsuyuki Nakanishi, Eiko Hosoe e Tadanori Yokoo, e como conselheiros tinham Shintaro Ishihara, Kazuo Ohno, Seiji Tsutsumi e Minoru Yoshioka. O Sr. Ishihara foi com certeza um seguidor do trabalho de Hijikata por muito tempo e esteve em muitas das performances, e, quando fizemos um vídeo de introdução para uma exibição de Tatsumi Hijikata no arquivo o Sr. Yokoo e o Sr. Ishihara fizeram participações no vídeo para nós. Desde o início, figuras notáveis de campos variados se reuniam ao redor de Hijikata. Seu Estúdio era como um salão onde artistas de vanguarda se reunião mutuamente numa atmosfera estimulante. Este era o espírito da época. Então, tínhamos essas pessoas proeminentes no comitê de direção do arquivo e estávamos trabalhando para coletar e organizar os materiais no Estúdio Asbestos num arquivo, mas a área em que tínhamos mais dificuldade era em financiar o projeto. Não apenas éramos incapazes de manter um imóvel para residir o arquivo, como também começamos a ter problemas em relação aos princípios orientadores sob os quais o arquivo deveria ser gerenciado, assim como os detalhes administrativos reais. Foi justamente na época em que tais problemas afloraram que você (Ishii) foi à Sra Motofuji e propôs que um Arquivo Hijikata deveria ser estebelecido na Universidade Keio.


I: Na época já existiam diversos arquivos já instituídos no Centro de Artes da Universidade Keio. Eu fui até a Sra. Motofuji e perguntei à ela se cooperaria conosco se fizéssemos um arquivo Tatsumi Hijikata. Ela imediatamente me deu uma resposta positiva, então, em 1997 eu fui discutir a possibilidade com o diretor assistente do centro de Artes na época, Fujio Maeda, e um membro da equipe, Tomoko Kusuhara. Ambos disseram que gostariam muito de ver um arquivo assim fundado, então, logo após, nós entramos no estágio de reparação. Os problemas que emergiram imediatamente foram o que adotar como os princípios para o arquivo digital e que sistemas isto envolveria.

M: Quem erigiu os princípios básicos para o arquivo foi o prof. Fujio Maeda. Além da decisão de fazer primordialmente um arquivo de pesquisa, ele também decidiu que um dos princípios-guia deveria ser fazê-lo possuir uma natureza genética. Como a palavra “genética” implica, este é um conceito que pressupõe a capacidade do arquivo gerar constantemente novas possibilidades. Não deveria se limitar a ser apenas um grande amontoado e exibições de materiais a respeito do artista mas deveria ser capaz de ser um arquivo que suporta a pesquisa dentro do processo criativo do artista. Ao mesmo tempo, o arquivo em si deve ser genético. Em outras palavras, o princípio é que não deve ter regras preestabelecidas, mas conter uma natureza orgânica e assim poder continuar evoluindo. É assim que o Arquivo Hijikata continua a ser gerido. Como o Arquivo se origina do trabalho do único artista Tatsumi Hijikata, não envolve um volume excessivamente grande de materiais. É por isto que acredito que o prof. Maeda quis fazer deste arquivo um modelo para os arquivos japoneses. Para o projeto do arquivo da universidade, a Keio já tinha fundos advindos do Ministério da Educação (atual Ministério da Educação, Cultura, Esportes, Ciência e Tecnologia), e para o começo do novo Arquivo Hijikata, um financiamento adicional foi garantido pela Fundação Saison. Durante o primeiro ano do projeto os materiais do arquivo foram transportados e reorganizados, e, para comemorar a inauguração do Arquivo houve um evento intitulado "Sobre Shiki no tame niju-nana ban". Ele trazia uma variedade de atrações incluindo uma exibição, um simpósio e a exibição de uma gravação de Hoso-tan (História da varíola) assim como um workshop de dança Butoh. Por fim, a edição e publicação do livro “Hangi Daitokan, Shiki no tame no niju-nana ban" serviu como uma verificação da total significância do evento comemorativo.

I: Você pode nos contar a respeito do atual conteúdo do material coletado e preservado no arquivo?

M: Na construção do arquivo coletamos todos os tipos de materiais pertencentes às atividades de Butoh do Hijikata. Como materiais de nível primário nós temos os mais efêmeros como folhetos, pôsteres e ingressos das performances, panfletos e programas, objets e objetos de arte. Também há vários manuscritos originais escritos por Hijikata e pessoas à sua volta. Temos também fotografias tiradas como registro das performances. Com a o cooperação dos fotógrafos envolvidos, nós fomos capazes de coletar mais de 10,000 fotografias. Assim como filmagens. A Sra. Motofuji esteve ativamente coletando registros em vídeo das performances no Estúdio Asbestos, então existe uma coleção bastante completa. Existem gravações em 8mm de trabalhos como "Anma", "Barairo Dance", "Nikutai no Hanran" e outros trabalhos dos anos 60. De 1972, as performances foram gravadas em filme 16mm. Depois disso, todas as performances no Estudio Asbestos foram gravadas em fitas de vídeo. Existem também 3 ou 4 documentários e mais de dez filmes (dramas) nos quais Hijikata aparece como ator. Com relação a estas fotografias e filmes, uma série de direitos autorais e de propriedade estão envolvidos, então aos poucos estamos tomando as medidas necessárias para que possamos mostrar e exibí-los publicamente. Ah sim, existe também uma coleção de livros que Hijikata possuía. Nestes livros existem numerosas anotações à mão feitos por Hijikata em suas páginas, que são fontes válidas de elementos formativos do pensamento de Hijikata e inspirações criativas. Até agora, porém, não houveram muitas oportunidades de revelá-los publicamente. Assim como existe uma porção de músicas que Hijikata costumava usar gravadas em fita. Estas músicas ainda não foram organizadas nem digitalizadas, por isso, via de regra, ainda não estão acessíveis ao público. Como material secundário, nós temos um arquivo exaustivo de artigos de jornal e matérias de revista. E, adicionalmente aos muitos escritos em relação à Hijikata em Japonês, nós também estamos vendo um aumento notável de pesquisas por estrangeiros.

I: E quanto aos materiais de 1940 e 50, antes que Tatsumi Hijikata se tornasse vastamente conhecido?

M: Eu acredito que praticamente não existam materiais ou registros remanescentes deste período. A fotografia mais antiga que nós temos de Hijikata dançando é de 1957 e elas pertencem à co-coreógrafa de Hijikata e co-performer na época, Akiko Ohara, que mais tarde emigrou para oBrasil. Elas são do que podemos considerar do período formativo do Butoh. Quando fui ao Brasil no ano retrasado, Akiko me deixou fazer cópias delas.

I: Existe algum texto remanescente que Hijikata escreveu ele mesmo? Há algo como notas de palco ou diários?

M: No meio das anotações, existem algumas ainda não arquivadas que pertencem à Sra. Motofuji e que aparentam ser um limitado número de anotações que foram aparentemente de processos criativos que não foram publicados ainda. Os materiais mais importantes no papel são a série de partituras que vieram a ser conhecidas coletivamente mais tarde como Butoh-fu. As partituras Butoh-fu que restaram no Estúdio Asbestos após a morte de Hijikata estão agora na coleção do nosso Arquivo Hijikata e eu acredito que existem algumas notas importantes em posse dos dançarinos principais do estúdio como Yoko Ashikawa e outros aprendizes de Hijikata.

I: As partituras Butoh-fu são muito importantes para explorar as origens e os princípios originais do Butoh de Hijikata. Entretanto, é muito diferente do que é conhecido como notação de dança no Ocidente, como por exemplo a Labanotation, de Rudolf Laban. As partituras Butoh-fu são únicas neste sentido.

M: No “Butoh-fu no Butoh” (Butoh de partituras Butoh-fu) de Hijikata , são dados nomes a todos os movimentos. Em outras palavras é um tipo de codificação. E se você colocar estes movimentos juntos se torna um trabalho de Butoh. Este era o método de trabalho de Hijikata conhecido como “Butoh de Butoh-fu”. Portanto, não há nada que possa ser chamado de script de espetáculo. Tudo o que restou do Butoh de Hijikata são os textos conhecidos como “Butoh-fu”. Assim como o Butoh-fu, existem cadernos nos quais nos quais Hijikata colou figuras e pinturas cortadas de livros de pintura ou revistas de arte e escrevia notas a respeito de como essas pinturas poderiam fornecem princípios para novas formas de movimento, assim fazendo pinturas uma fonte de recursos para o movimento. Nestas páginas nós podemos ver suas notas para nomes de diferentes movimentos ou notas sobre qual parte dos recortes eram para ser usadas e de que forma, assim como notas sobre que tipo de figurino seriam utilizados. Existem também alguns Butoh-fu feitos em grandes pedaços de papel e outros escritos em pequenos recortes de papel. Dos vários Butoh-fu, os mais claros são aqueles que dizem respeito as notas registradas pelos estudantes do que o Hijikata dizia nos ensaios. Esses registravam os nomes de movimentos e notas a respeito da movimentação de que eram consistidos ou expressões poéticas ou metafóricas e palavras que inspiravam as imagens usadas. Independentemente do que eram consistidos, os “Butoh-fu” são materiais muito importantes para mostrar o processo criativo e a metodologia de Hijikata. Eles são muito interessantes de serem lidos atualmente e certamente são uma fonte essencial para a pesquisa da arte do Butoh de Hijikata. Existem alguns estudantes estrangeiros que escreveram suas teses de doutorados sobre os Butoh-fu.

I: Eu acredito que dar nome a cada movimento individual para que os dançarinos pudessem recriar os movimentos de um trabalho usando o Butoh-fu foi certamente um método revolucionário adotado pelo Butoh de Hijikata nos anos 70, mas ler (decifrar) o Butoh-fu é muito difícil. Não é o tipo de anotação que qualquer um poderia aprender para recriar, a partir disso, a movimentação com a prática, é?


M: Você está certo, não é. Existem alguns casos como para a peça "Nadare-Ame" em "Shiki no tame no niju-nana ban" onde existe um caderno inteiro escrito para uma peça, mas a maioria são apenas anotações registradas de idéias ou imagens que Hijikata tinha em sua mente. Embora possa ser chamado de um tipo de notação, não podemos especificar tipos de movimento dos textos do Butoh-fu que não são nada além do que uma coleção de expressões codificadas. Todavia, os aprendizes de Hijikata são capazes de recriar movimentos de nomes escritos lá. Por exemplo, no caso de Yukio Waguri, foram ensinados a ele entre 1200 a 1300 tipos de movimentos do Hijikata. E uma vez que ele ouve o nome do movimento, pode imediatamente reproduzi-lo. Hijikata criou e desenvolveu um número muito grande de movimentos e uma das coisas que nós temos que pensar no estudo do Butoh-fu é descobrir que movimentos haviam, quais eram as fontes por trás deles e sob quais códigos foram criados. E então nós temos que explorar a problemática de como os mesmos foram agrupados em peças de dança Butoh. Além disso, eu acredito ser possível que, ademais de seqüenciar movimentos em peças, Hijikata queria criar um “Butoh de Butoh-fu” que remanesceria como um tipo de estilo que poderia ser transmitido para as gerações seguintes de dançarinos.

I: Eu acredito que este tipo de estudo do Butoh-fu é uma das atividades extremamente importantes do Arquivo, mas em que outras atividades o Arquivo está envolvido?

M: Desde o começo, os trabalhos mais importantes tem sido classificar os materiais do Arquivo e digitalizá-los. E disso advém os trabalhos de criar um inventário e um banco de dados dos materiais para tornar o arquivo acessível ao público. Além disso, a fundação do Arquivo Hijikata Tatsumi tornou possível para nós fazer pedidos a uma variedade de pessoas para a entrega e doação de materiais que não eram possíveis de coletar durante a época do Estúdio Asbestos. Tais esforços de coleta e as medidas relacionadas ao copyright são outro aspecto de nossas atividades no Arquivo. No que diz respeito às fotografias, graças à cooperação de um grande número de envolvidos, fomos capazes de reunir não apenas impressões mas também uma vasta quantidade de negativos.

Entrevistas com pessoas que estiveram envolvidas com Hijikata e o arquivamento das gravações dessas entrevistas é outro projeto em andamento do Arquivo. E, embora não seja fácil organizar eventos por causa da natureza de nossas instalações, nós organizamos eventos relacionados ao Butoh como exibições de nossos materiais e conferências. Organizamos performances a cada ano convidando dançarinos do Japão e além-mar, e em março deste ano realizamos uma leitura de "Yameru Maihime" no dialeto Akita nativo de Hijikata. Nós freqüentemente respondemos a pedidos de outras universidades, museus e instituições de pesquisa estrangeiros para participar de seminários, exibições e também de filmagens.

I: Uma dessas exibições que me vêm a mente é “Barairo Dance no Iconology – Reconstruindo Tatsumi Hijikata” realizado em 2000. "Barairo Dance - à la maison de M. Civecawa" é um trabalho de 1965 no qual os contemporâneos de Hijikata na arte de vanguarda, Natsuyuki Nakanishi, Tadanori Yokoo, Mitsuo Kano, Gempei Akasegawa e Sho Kazakura participaram com trabalhos de arte. E envolvidos com a música estiveram Takehisa Kosugi e Yasunao Tone. Isto fez do mesmo um trabalho colaborativo entre artistas de Butoh, arte contemporânea e música.

M: "Barairo Dance" é um dos trabalhos relativamente recentes de Hijikata. Quando eu conversei com o Sr. Yokoo-san e o Sr. Nakanishi sobre o mesmo e estudei os materiais que me foram entregues por eles, vários aspectos do processo criativo de Hijikata ficaram evidentes. Eu descobri que a cenografia e o figurino foram um resultado de idéias tanto de Hijikata quanto de sugestões do Sr. Nakanishi. Além disso, os pôsteres pelos quais o Sr. Yokoo ficou conhecido foram na verdade um produto de uma sinergia de idéias colocadas de Hijikata, Nakanishi e Yokoo. Desta forma, Hijikata pode ser chamado de um (Serge) Diaghilev do Japão pela maneira que trouxe os talentos de uma variedade de artistas. Então, decidimos por este tema da exibição com visando propor um modelo de um arquivo “genético” que daria suporte a pesquisas sobre os processos criativos de um artista.

I: Eu acredito que Hijikata foi definitivamente um gênio criativo em muitos aspectos, mas mesmo para um gênio como ele não existem modos de toda a arte que podemos associar a ele virem puramente de dentro da mente e da alma de um único homem. Ele com certeza foi influenciado e inspirado por uma grande variedade de artistas, começando por Antonin Artaud e Jean Genet e incluindo seus contemporâneos japoneses em inúmeros campos, e acumulou esta inspiração em seu interior. Por exemplo, a respeito do subtítulo de "Barairo Dance" diz-se que é uma homenagem à Tatsuhiko Shibusawa. Revelar coisas como esta através da pesquisa do processo criativo de Hijikata é com certeza algo de grande interesse para todos aqueles interessados em sua arte e trabalho. Um dos projetos sendo conduzidos com esta aproximação é o “Arquivo do Movimento” (Ugoki no Archive) que vocês estão criando. Você nos contaria sobre este projeto em maiores detalhes?

M: O Arquivo do Movimento está sendo criado criado com a cooperação de Yukio Waguri e Moe Yamamoto. Por exemplo, há uma peça chamada "Shomen no Isho" que Hijikata coreografou para Moe Yamamoto em 1976. Para esta peça, as “Notas de Butoh” que Moe copiou em detalhes das explicações de Hijikata e uma gravação em vídeo da performance sobrevivem. As notas de Butoh de Moe são extremamente valiosas porque ele escrevia tudo o que Hijikata dizia a ele, então me fez pensar se nós não poderíamos usar tais notas para recriar todos os movimentos anotados nelas. Existem mais ou menos 330 movimentos que Moe recebeu de Hijikata para esta peça. Nós fizemos Moe representar todos dos movimentos e filmamos cada um deles. Além do Moe, nós também terminamos de filmar os movimentos que Waguri re-encenou para nós da caderneta de partituras Butoh-fu que ele registrou, e há também algumas outras que Saga Kobayashi tinha. Quando nós juntamos tudo, tínhamos filmado cerca de 1500 a 1600 tipos de movimentos. Gravando em filme os movimentos de Butoh-fu que restaram, o projeto Arquivo do Movimento procura revelar a estrutura do Butoh de Butoh-Fu de Hijikata e assim revelar seu desenvolvimento de movimentação e metodologia para sua coreografia. Até agora nós apenas temos essa coleção de filmes em servidor e discos-rígidos, mas eventualmente eu gostaria de desenvolver um banco de dados das filmagens. Eu acredito que isto vá se tornar um tipo raro de filme de Butoh-fu, de um tipo que provavelmente não existe em nenhum outro lugar do mundo.

É um trabalho que vai além das funções tarefas de um arquivo normal de coletar e preservar materiais do passado para criar novos materiais adicionando interpretações contemporâneas. Esse projeto já produz alguns resultados, incluindo a criação de um DVD explanatório intitulado “Tatsumi Hijikata – Butoh do Butoh-fu - O Butoh Notacional de Tasumi Hijikata” (versões em inglês e japonês) e um livro intitulado "Tatsumi Hijikata – Butoh do Butoh-fu – A criação decódigos e descobrimento do método" também publicado, que explica o processo de filmagem das movimentações e oferece uma explicação teórica do Butoh do Butoh-fu.


I: Quando os movimentos são feitos para a filmagem, o que vocês fazem a respeito do figurino?

M: Nós não demos atenção a coisas como o figurino em absoluto, apenas focamos puramente na movimentação. Como o propósito tem sido procurar pela estrutura e metodologia do Butoh de Hijikata, por assim dizer, até agora nós não estivemos interessados nos trabalhos específicos em si. Quanto aos comentários dos performers, eu tenho feito entrevistas e compilações de seus comentários. O método do Butoh-fu de Hijikata envolvia ligar diferentes movimentos aprendidos através de uma prática vigorosa para formar sucessões de movimentos que se tornariam cenas, e então ligar cena a cena para criar um trabalho. Embora a coreografia seja estritamente determinada, não é dado ao dançarino um fluxo predeterminado ou um único tema consistente (história) para o dançarino encenar.

I: Existe a possibilidade de que alguém venha a utilizar alguns dos cerca de 1500 movimentos que vocês gravaram para fazer novos trabalhos de Butoh?


M: Em parte, nós esperamos que isto aconteça. Por outro lado, há pessoas que dizem criticamente, “qual é a função dessas filmagens? Sem o Hijikata, esses movimentos não perdem o sentido?”. E eu entendo suas razões. Entretanto, existe a possibilidade que algum outro dançarino genial venha a fazer algum uso da metodologia de Hijikata, e eu acho que seria ótimo se isso acontecesse.

I: Na sua exibição mais recente ano passado, você focou no trabalho que muitos consideram ser a culminação do Butoh de Hijikata nos anos 60, o solo "Tatsumi Hijikata to Nihonjin – Nikutai no Hanran" (Tatsumi Hijikata e os Japoneses – A Revolta do Corpo).


M: Ademais ao Arquivo Tatsumi Hijikata, o Centro de Artes da Universidade Keio também tem arquivos para Shuzo Takiguchi, Shoichi Yui e Isamu Noguchi. Quando foi decidido fazer uma exibição trazendo materiais desses arquivos sob o mesmo tema, o resultado foi a exibição “1968 –Nikutai no Hanran to sono Jidai” (1968 – A Revolta do Corpo e sua Época). "Nikutai no Haran" estreiou em 1968, que foi um ano essencial em muitos sentidos, simbolizado pelo pico do protesto do movimento estudantil japonês. Na exibição de nosso arquivo foi criada uma instalação para expressar isso. A exibição foi seguida da edição de um livro intitulado "Nikutai no Haran – Butoh 1968 / Semiologia da Existência" que trouxe uma vasta coleção de fotografias das performances de 'Nikutai no Haran" e todos os materiais do arquivo como notas a respeito de ingressos e listas de convidados da platéia que nunca haviam sido mostrados antes. Também ansiando reinvestigar os pensamentos de Natsuyuki Nakanishi em relação à cenografia para "Nikutai no Haran", eu também incluí uma discussão com o artista e materiais relacionados no livreto.

I: Existe alguma partitura Butoh-fu remanescente para "Nikutai no Haran?

M: Não, infelizmente não restou nenhuma. Além disso, nem mesmo sabemos se realmente houve um Butoh-fu e resta muito pouco em relação aos dados de músicas e outros materiais relacionados à produção.

I: Isso significa que o trabalho que mais pode ser comparado diretamente com as partituras de Butoh-fu que Hijikata deixou é "Shiki no tame no niju-nana ban"?

M: Das cinco peças em "Shiki ni tame no niju-nana ban", algumas podem ser recriadas em parte no que se refere ao Butoh-fu que sobrou.

I: Para "Shiki no tame no niju-nana ban" existem alguns manuscritos ou notas escritas além das partituras de Butoh-fu?

M: Existem coisas que ele disse em entrevistas de jornais. Para começar, ele fez coisas como inventar frases de efeito para descrever sua arte, como “Tohoku Kabuki”, mas nessas entrevistas nem em outro lugar, ele nunca falou diretamente sobre o que ele procurou expressar em seus trabalhos e em seus próprios pensamentos. Em situações como colóquios ou coletivas com a imprensa, Hijikata não fala em termos específicos a respeito de sua metodologia, então as únicas descrições que nós temos são feitas por terceiros. Entretanto, existiam algumas verdades ocultas dentro das coisas que ele dizia, então nós precisamos selecionar essas coisas e descobrir o que realmente ele estava revelando. Por exemplo, ele mentiu muito sobre sua origem. Falando como se fosse verdade, ele disse coisas como ele era um de onze crianças e que todos os irmão morreram na Guerra e todas as irmãs se tornaram prostitutas, por exemplo. Nós podemos especular que Hijikata achava algo real em coisas escondidas como essa. Contudo, algumas dessas falas foram publicadas como verdadeiras e houveram ocasiões em que pesquisadores estrangeiros escrevendo biografias de Hijikata tomaram tais histórias como verdadeiras.


I: Dentre as mais famosas citações de Hijikata tem aquela em que ele diz, “Eu tenho uma irmã mais velha vivendo em meu corpo. Quando estou concentrado tentando criar um trabalho de dança, ela rasga a escuridão em meu corpo e come mais do que necessita. Quando ela se levanta, eu me encontro sentando inconscientemente”. [Do livro de "Hijikata Inu no Jomyaku ni Shitto suru koto kara (De ter ciúmes das veias de um cão, 1976)]. Quando considerado à luz da educação de Hijikata (na região nordeste de Tokohu), palavras como essas realmente estimulam nossa imaginação, mas nós somos incapazes de dizer em que grau eles são verdade e em que grau elas advem do mundo de sua imaginação intensa.

M: Quando pensando a respeito da criação do Butoh, não importa se a imaginação aflora de fatos ou da ficção. Para alguém como eu envolvido na administração de um arquivo, contudo, eu sinto que é meu trabalho identificar o que é fato o máximo possível. Também no que diz respeito à cronologia de Hijikata, eu fiz um estudo intenso das gravações disponíveis para criar uma cronologia e torná-la pública. Eu estou agora envolvido no processo de escritura de uma biografia crítica incluindo a educação/formação de Hijikata que nós publicamos anteriormente num jornal.

I: Uma das atividades de seu arquivo é cooperar em exibições que aproximam o Butoh do ponto de vista artístico, como “Bijutsu to Butoh no Hijikata Tatsumi ten" ( Exibição Tatsumi Hijikata – Arte e Butoh) que foi feita no Museu Ikeda de Arte do Século 20 em 1997-98.

M: A primeira exibição como essa aproximando o Butoh do ponto de vista da arte foi mostra principal na Galeria do Centro de Arte Cívica Yokohama em 1989 intitulada “Hijikata Tatsumi to sono Shuhen ten – Butoh to Bijutsu no Hyogen Sekai wo Saguru” (Exibição Tatsumi Hijikata e Contemporâneos – Explorando o mundo da expressão no Butoh e na arte. Foi mais ou menos nessa época que percebemos as possibilidades de exibições conectando arte e Butoh, e desde então fizemos várias exibições. A última dessas maiores exibições foi uma no Museu de Arte Taro Okamoto na cidade de Kawasaki intitulado “Nikutai no Surrealism: Butoh-ka Hijikata Tatsumi” (Surrealismo do corpo: O artista butoh Tatsumi Hijikata).

I: Estou certo de que existem muitos materiais sobre Hijikata que virão à tona futuramente, então eu acredito que haverá uma necessidade do trabalho de digitalização e a re-organização continuar. Além desse trabalho, contudo, existe algum projeto em particular que vocês queiram se dedicar no futuro?


M: Embora não seja nada de novo, um dos problemas do Butoh atualmente é sua internacionalização. A grande maioria dos escritos sobre Hijikata atualmente em circulação são aqueles escritos ou em inglês ou francês. Esses escritos não estão sendo propriamente apresentados no Japão. Eu acho que alguma coisa deveria ser feita sobre essa situação. Independentemente de questões sobre a qualidade de tudo o que tem sido escrito por autores estrangeiros, eu acho que o Japão deveria estar ciente do que está sendo dito sobre Hijikata e o Butoh além-mar. O ensaio "La reception du buto en France: malentendus et desires" que nosso porta-voz convidado Pages Sulvianes apresentou na Conferência Internacional de Butoh que organizamos em janeiro de 2009 era muito estimulante intelectualmente. Devido a estímulos como este, nós começamos a traduzir, em versão resumida, a coletânea de ensaios sobre Butoh intitulado "Buto (S)", publicados na França em 2002.

I: Eu concordo que é muito importante haver um circulação internacional de discussão a respeito do Butoh, entre o Japão e o mundo. Pra melhor ou pior, há idéias sobre Butoh que ganham uma dinâmica própria e que por vezes circulam sem serem verificadas no exterior. Mas o mesmo ocorre aqui no Japão. Eu definitivamente acredito que é necessário ter um circulação internacional saudável das idéias centradas no Butoh.

M: Um dos focos desses esforços a serem trabalhados agora é examinar o Butoh do ponto de vista histórico. Com um espelhamento do movimento distante do Butoh do Japão nós precisamos, à essa altura, examinar a história do Butoh novamente. Quando os artistas de Butoh, e nós que estudamos o assunto, alcançamos um beco sem saída em nosso questionamento fundamental sobre o que é o Butoh, nós freqüentemente voltamos ao Hijikata. Nós nos perguntamos o que Hijikata dizia realmente sobre certas coisas e quais eram seuspensamentos. Embora sabendo que tais coisas podem não nos levar imediatamente a respostas, precisamos ter as informações e materiais que podem ser o gérmen do pensamento arquivados em umaf orma acessível para as pessoas. Claro, nós não podemos nos tornar o Hijikata, mas podemos tornar acessíveis os materiais que mostram um certo montante do que Hijikata realmente dizia e fazia e pensava. Eu acredito que o papel do Arquivo Tatsumi Hijikata é realizar essa tarefa


Obrigado, senhores,
Rogê

rogervalenca@gmail.com